domingo, 18 de julho de 2010

O quadro branco

O sonho que tive esta noite foi assim, simbólico (considerando que foi meu último dia de trabalho). Sonhei que estava na casa de uma amiga e olhava para um muro branco com letras em alto relevo de cimento. Tudo pintado de branco. Comecei a mexer nessas letras e acabei derrubando-as deixando suas marcas pretas naquele muro que chegava a reluzir. Pedi ao pai da minha amiga um balde com cal para que eu mesma pintasse o muro e consertasse o que havia feito. Comecei a pintar e, de repente, via um quadro branco na minha frente. Parei diante dele e fiquei olhando. Até que acordei. A internet disse: “Significado de sonhar com Branco. Sonho excelente, alvissareiro. O branco significa pureza, amor, beleza.” E eu acreditei.
Sinto assim, que agora começa uma nova etapa mesmo, um quadro branco pronto a ser preenchido. Um quadro branco com todas as possibilidades para experimentar. Como se a vida tivesse sido passada a limpo. Como se eu tivesse a chance de recomeçar. Mas não recomeçar do zero; recomeçar com tudo o que aprendi tendo a chance de acertar ou errar novos erros, de aprender novas lições.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Da retirada

"- Senhor meu - respondeu Sancho - retirar-se não é fugir; nem no esperar vai prova de sisudeza quando a coisa é mais perigosa que bem figurada. Próprio dos sábios é o pouparem-se de hoje para amanhã; e saiba Sua Mercê que um ignorante e rústico pode mesmo assim acertar uma vez por outra com o que chamam regras de bem governar. Portanto não lhe pese de haver tomado o meu conselho; monte no Rocinante, se pode, ou eu o ajudarei, e siga-me, que me diz uma voz cá dentro que mais úteis nos podem nesta ocasião os pés que as mãos".
(Cervantes)

Ao ler o extrato acima, por algum tempo fiquei pensando no post sobre a Impermanência. Lá falei de uma espécie de “herança genética” da inconstância que circula pela minha família fazendo-nos mudar muito mais que o necessário.

Se, por um lado, essas mudanças excessivas podem ser vistas como algo nocivo e, até certo ponto pejorativo, por outro, pode ser um sinal de sagacidade e inteligência. Neste sentido, mudar torna-se fruto da coragem (ou da falta dela) e da sensibilidade. Ou seja, a primeira diz respeito à constatação de que não se consegue seguir adiante por medo, por insegurança, por falta de perspectiva ou porque há um caminho tão melhor do que o que se está que é preciso encher o peito e fazer um corte brusco.

A segunda exige a habilidade de perceber (e ouvir a “voz cá dentro”) que é tempo de esperar ou até mesmo adequar um pouco a direção do olhar, para poder continuar. O comando para os pés, andar para outro lado ou parar, faz-se mais perspicaz do que a habilidade de continuar esculpindo algo que, se sabe, não é mais tempo, não resultará em bela forma.

Seja qual for o motivo, o ato de mudar está ligado ao sentimento de encontrar alegria no percurso, não apenas na chegada, ou como bem disse Caetano: “encontrar a mais justa adequação, tudo métrica e rima e nunca dor...”.

Acho que meu coração fica mais tranquilo por existir também esta outra leitura.

sábado, 5 de junho de 2010

Da exigência

Outra coisa que descobri olhando para meus familiares, foi a herança que meu pai cultivou. É incrível como um exemplo pode ser muito mais forte do que as palavras.

Meu pai sempre foi um homem calado e, até certo ponto distante. Nunca sentava à mesa para comer com a gente; não tínhamos esses rituais tão importantes. Também nunca foi de conversar, perguntar sobre meu dia, sobre a escola, sobre a vida. Muito desse comportamento se explica, ou se agrava (acredito) pela atividade que exerceu por muito tempo: trabalhou no IML, muitas vezes carregando corpos – atividade nem um pouco gratificante.

E tudo isso por um senso de responsabilidade incrível, por uma necessidade dele de não deixar que nada nos faltasse. Mas faltou. Sempre falta alguma coisa. Faltou o afago no cabelo, o abraço apertado e ao mesmo tempo solto e leve, sem a restrição da distância fina e invisível que nos separou. Faltou o calor do colo, faltou a mão para segurar na hora do choro.

Mas não faltaram exemplos – de pró-atividade, de trabalho duro e honesto. Sempre vi meu pai consertando o que estava quebrado, sempre procurando o que fazer, trabalhando em até 3 empregos simultaneamente para suprir nossas necessidades. E foi esse comportamento que moldou minha visão e expectativa com relação aos homens, modelo que carrego ainda hoje.

Para mim homem tem que ser “o homem da casa” e isso me fez exigente demais. Não encontrando esse modelo, senti a necessidade de me tornar independente, de não esperar que homem nenhum fizesse o que julgo necessário.

Fica difícil, a partir deste ponto de vista, não ser exigente ao extremo comigo mesma. Fazer com que as coisas aconteçam a despeito de ter ou não alguma ajuda. Essa exigência recai, inevitavelmente, sobre as pessoas que me cercam: exijo delas no mesmo nível que exijo de mim; exijo até mesmo a perfeição que, certamente, não tenho.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Da impermanência

Hoje pela manhã, refletindo sobre um sentimento que tem me angustiado fiquei pensando em como classificá-lo e de onde vinha.

É interessante perceber como carregamos sentimentos e ações dos nossos familiares, próximos ou distantes. Sempre observei e até mesmo critiquei minha avó por sua necessidade constante de se mudar de casa. Desde que me entendo por gente, minha avó já se mudou milhares de vezes e, não só de casa... Quando a coisa aperta, ela se muda até de cidade.

Minha mãe, por sua vez, também gosta de mudar de cidade: quando está em Fortaleza quer estar em São Paulo; quando está em São Paulo quer voltar correndo pra Fortaleza. Além disso, ela muda muito de planos: às vezes quer uma casa no campo e uma aposentadoria que lhe permita cuidar de galinhas e plantas; às vezes quer dar um salto na carreira, estudar e fazer mestrado.

Meu tio, irmão da minha mãe e, quase que obviamente, filho da minha avó, muda de esposa. Acho que esse é o tipo de mudança mais complicado. Ele acaba de terminar seu terceiro casamento e, pelo que tudo indica, está caminhando para a quarta união, que sabe-se lá quanto tempo vai durar.

Foi aí que percebi que eu também tenho mania de mudar: muitas vezes essa necessidade não passa do estágio da vontade e acho que isso é bom. Lembrei de todas as vezes que mudei de emprego e de todas as vezes que quis mudar de país, que eu quis mudar de vida.
Sempre acreditei que essa impermanência guarda uma relação íntima com algo não resolvido dentro. É como se fosse uma válvula de escape para não encarar a realidade dos fatos – não posso mudá-los então mudo eu, giro, dou uma pirueta e vejo em que ângulo vou parar.

Entendo que mudanças são necessárias e até mesmo inevitáveis em alguns casos, mas é importante que, na medida do possível, sejam planejadas, tenham um objetivo e não funcionem como fuga que, muitas vezes, é fuga de si mesmo.

As mudanças, quando bem orientadas tendem a ter resultados positivos com reflexo no aumento da auto-estima de quem muda. Caso contrário, implica em instabilidade, construções pouco duradouras e resultados voláteis o que, quase nunca, representa um benefício, já que se planta, mas não se colhe (pois não dá tempo).

Bem, perceber a tempo já é um começo... Até que eu mude de ideia!

sábado, 1 de maio de 2010

QUAL O ASSUNTO DO DIA?

Tenho tido cada vez mais dificuldade de escrever – uma mistura de preguiça, falta de tempo e desculpas esfarrapadas que invento para mim mesma. A verdade é que o medo de me desafiar se misturou a uma falta de debates diários sobre assuntos mais diversificados e porque não dizer, mais culturais.

Tento, até com certo excesso de exigência, continuar a ler bons livros a frequentar salas de cinema, ver bons filmes (ou ruins para tentar entender a diferença e fazer algum tipo de crítica), ir ao teatro, enfim. Tudo isso, sem dúvida, é alimento para o intelecto, para a alma. Mas é fundamental que haja a troca, a discussão. A diferença de pontos de vista fomenta a criação de novas relações, de conexões que passam pelo olhar e pela percepção do outro. É uma nova “organização do material” colocando o tema sob diferentes enfoques.

Dia desses comentei com um amigo que algumas pessoas, em especial da região Sudeste, ainda insistem em ter (e por vezes nutrir) certo preconceito com relação a outras regiões do país com destaque para a região Nordeste. Entretanto, foi morando em Fortaleza que conheci algumas das pessoas (e amigos) mais brilhantes com quem tive o prazer de debater (mas principalmente de aprender) sobre arte, cinema, dança, literatura e toda forma de manifestação cultural que enobrece qualquer pessoa.

Ao contrário, quando voltei para São Paulo, cidade cosmopolita, onde o acesso à cultura existe para qualquer gosto e bolso, me deparei, não sem espanto, com uma completa falta de variação na pauta diária. Não quero ser generalista, mas até hoje pude identificar três assuntos básicos que vão se alternando: futebol, novela e vida dos outros.

Adoro futebol, torço, vou ao estádio e até xingo se for preciso, mas não faço disso o motivo principal da minha existência e tão pouco de discórdia. Também não troco o prazer da leitura por um capítulo de novela cujo enredo já está ultrapassado há muito tempo. Mas pior que só falar em quem vai casar com quem ou quem traiu quem na ficção, é transferir o enredo para a vida real, ou melhor, para a vida alheia real com uma pitada de maldade para dar ênfase ao drama.

Será que para essas pessoas o motivo para esta falta de variedade é também preguiça e falta de tempo? Chego a me envergonhar de ter admitido esse tipo de pensamento no primeiro parágrafo deste texto... Se for isso, me proponho a mudar, como dizem os mineiros, o rumo desta prosa. E então pessoal, qual é o assunto do dia?

sábado, 17 de abril de 2010

QUEM IMPÕE LIMITES?

Esta semana comecei um curso numa instituição extremamente bem conceituada. Cheguei cedo, fiquei lendo um texto enquanto esperava pela chegada dos meus novos colegas e dos professores. E qual não foi minha surpresa quando se apresentou como professor (e não apenas professor, mas coordenador do curso!) um senhor, ainda na casa dos 40, bonachão e fanho! Não tenho absolutamente nenhum problema com as deficiências ou características físicas de ninguém, a situação me chamou atenção apenas por ser inusitada dentro dos padrões que aprendemos para determinados estereótipos e até mesmo para determinados papeis.

A princípio aquela voz fina chamava atenção, mas o que poderia ser considerado um “defeito” aos poucos foi sendo escondido pela apresentação brilhante que então se iniciou. Foi então que comecei a pensar sobre os limites que nos impomos.

Para quebrar o gelo, obviamente (ou não tão obviamente assim), o professor fez uma brincadeira a respeito da sua, vamos dizer, limitação. Disse a todos que poderíamos até não aprender sobre o tema do curso, mas com certeza aprenderíamos a entender qualquer fanho. A partir dali, ninguém mais prestou atenção em como as coisas eram ditas, mas realmente, no que estava sendo dito.

Fiquei pensando que por muitas vezes coloquei diversos obstáculos à minha frente, especialmente, na vida acadêmica que era, de fato, meu sonho profissional. Me senti até um pouco envergonhada diante daquele professor, doutor naquela instituição reconhecida internacionalmente e que se impôs e trilhou ali também seu caminho profissional pelo seu conhecimento, pelo seu trabalho, por sua seriedade e comprometimento. Mas além de tudo, por sua persistência, simplesmente por não desistir.

E aí, me perguntei: quem impõe os limites? E porque nos rendemos a eles? Entendi que quando paramos diante de um limite é porque acreditamos mais nele do que em nós. E que, muitas vezes, embora o limite pareça vir de fora, nós já acreditávamos nele antes mesmo que ele se apresentasse. E quando ele aparece, fica fácil de se instalar, paralisar nossas ações, fazer com que mudemos de direção e o pior, fazer com que abandonemos nossos sonhos.