segunda-feira, 21 de maio de 2012

Preguiça da pressa

Ando com preguiça da pressa, tenho a sensação de estar no caminho inverso das urgências, no descompasso da cidade que não para e quer sempre mais. Sinto como se o Coelho Branco, aquele da Alice, olhasse para o seu relógio e ao perceber que os ponteiros andam em câmera lenta, olhasse para mim e dissesse: “Para que correr? Não estamos atrasados e temos tempo de sobra”.

Andar na contramão é uma escolha. Ser olhada de viés é a consequência. Num mundo onde o tempo é hiperacelerado e o espaço encolheu, fazer a opção por ir mais lento e alargar horizontes soa como loucura quando não como preguiça ou apatia. Na verdade, entrar nessa roda-viva sem tecer ao menos um fio de questionamento se isso se encaixa no modo de vida que queremos é que me parece insano.

Acabamos por fazer coisas demais, comprar coisas das quais não precisamos simplesmente por parecer mais adequado, mais bem aceito, “normal”. Essas coisas que compramos sem precisar, esses títulos que acumulamos sem, muitas vezes usar, esses papéis que desempenhamos sem questionar, se tornam as correntes que arrastamos e que com o tempo pesam ao ponto de causar feridas.

E arrastar corrente pesada em tempo de velocidade me parece um paradoxo ainda maior do que escolher a leveza e a liberdade de seguir sem tantas cobranças e exigências. Uma epifania aparentemente. Mas me parece uma forma bem mais prazerosa que aproveitar o agora já que nada dura para sempre, como já dizia aquele mesmo coelho à Alice: “Alice: Quanto tempo dura o eterno? / Coelho: Às vezes apenas um segundo”.

sábado, 5 de maio de 2012

Cidade e desejo

Lembro que todas as vezes que pensei em me mudar de cidade, ou que me mudei efetivamente, fui motivada por um desejo. Desejo de viver com qualidade, de morar em um lugar mais bonito, de conhecer novas pessoas ou de rever tantas outras. Olhar para uma cidade e imaginar-se nela é experienciá-la como imagem possível, como sonho. E ainda que a cidade já seja conhecida, enquanto não se chega ao destino, é o desejo que conduz a imaginação e dá forma a uma cidade latente porque ainda não habitada.

É o uso que nos dá a noção do modo de ser da cidade e dos seus moradores. Viver a cidade é reconhecê-la, é ler as sutilezas do seu dia-a-dia e traduzi-la. E é aí que pode nascer o descompasso entre o que se imaginou e o que de fato foi encontrado, porque a cidade é uma para quem acaba de chegar e outra para quem nela já está há algum tempo. É uma para o estrangeiro e outra para quem dela nunca se afastou.

Na dinâmica cotidiana é que se confrontam expectativas e vivências que ora se confirmam deixando com a gente a alegria do acolhimento e ora se negam deixando claro que o movimento não cessa para quem sempre renova vontades.

De qualquer forma, desejo é aquilo que a gente carrega, que nos acompanha e nos move independente de onde estamos ou para onde vamos. É como escreveu Ítalo Calvino: “os passos seguem não o que se encontra fora do alcance dos olhos, mas dentro (...)."